Hoje a gente vai suspender a programação normal dessa newsletter para contar uma história.
Porque tem uma dificuldade em trabalhar com a Psicologia do Dinheiro, uma dificuldade que desmotiva: é solitário.
Sem endossar qualquer vitimização, pouca gente hoje, no Brasil, fala sobre o assunto. Na verdade, pouca gente sequer compreende a dimensão do assunto.
Com alguma frequência, quando nos perguntam o que fazemos, não é raro ouvir um: “Ah, entendi, vocês ensinam as pessoas a ficarem ricas”, e risos. A gente ri (chorando por dentro), e muito simpaticamente vamos explicar que não, não é sobre isso. É sobre muito mais.
A história de hoje fala um pouco sobre essa solidão, sobre ser incompreendido, sobre, enfim, ir contra a corrente de uma cultura financeira que está mais preocupada com o capital do que com as pessoas.
Ana Cláudia Machado trabalhava no banco.
Atuou em diversos papéis, entre eles, o de gerente de negócios, o que lhe deu a chance de ter enorme contato com a realidade de pessoas (super)endividadas, por um lado, e do sistema bancário, por outro.
Viu logo as armadilhas criadas pelo mercado financeiro para se apropriar do salário dos seus clientes, e como era psicóloga, teve a sensibilidade para notar as consequências do superendividamento na vida deles.
A quantidade de clientes em situação de superendividamento começou a elevar-se de forma que me despertou a atenção, sobretudo pelo fato de eu estar lidando com servidores públicos cujos salários eram relativamente elevados. Em alguns atendimentos, de um modo totalmente esdrúxulo e inapropriado, eu acabava oferecendo apoio emocional àqueles que notadamente demonstravam sofrimento psíquico em razão das altas dívidas. Numa clara demonstração de que eu estava no local errado fazendo a coisa certa, os papeis que eu exercia como profissional começaram e se confundir, e chegou ao ponto de alguns clientes passarem a me visitar mais vezes que o habitual.
Ana desenvolveu algumas ações institucionais, se envolveu com a causa, mas o contexto ainda era pesado. Porque embora conseguisse renegociar algumas dívidas e, nos atendimentos individuais, enfocar na mudança de comportamento, o banco ainda tinha suas metas… No fundo, as duas coisas não se batiam.
Mas se ver obrigada a voltar ao cenário das ligações telefônicas para oferta de crédito foi mesmo o estopim.
Foi aí que nem a segurança financeira, nem a estabilidade de um emprego público, nem os inúmeros benefícios — assistência médica, participação nos lucros e resultados do banco, tíquete-alimentação mensal no valor de uma bolsa de mestrado — compensavam mais tamanho sacrifício.
Deixou o emprego no banco para fazer um doutorado sobre saúde financeira com o sonho de ser professora em uma universidade pública para ensinar o conteúdo que ela não recebeu na graduação em psicologia.
Enfrentou a escassez de bibliografia sobre o assunto, o estranhamento dos pares, a redução de renda, se tornou professora da Universidade Estadual de Minas Gerais e, depois de muitas tentativas, conseguiu ministrar o curso de “Saúde Financeira” e, nesse semestre, o curso de “Psicologia do Dinheiro”.
Talvez você não saiba, mas mas a oferta de disciplinas votadas a essa área ainda é algo extremamente raro no Brasil. A gente fica falando que nosso trabalho é pioneiro e coisa tal, mas é porque é mesmo. Estamos, literalmente, construindo a área no Brasil, e a Ana faz parte desse movimento. Não há outros docentes que ministram disciplinas nessa área, então, essa é uma caminhada solitária, pelo menos na universidade onde ela atua.
E ela ia tocando seu trabalho sem saber da gente, e sem acesso a outras pessoas que falavam sobre isso no Brasil, até que ela recebeu um flyer.
Devia ter um ipê amarelo nesse flyer, porque o ipê foi o símbolo do I Encontro de Psicologia do Dinheiro na Prática Clínica do Brasil, que a gente organizou em julho desse ano.
Ali, a Ana conheceu a gente, e logo depois a gente conheceu a Ana.
Mas foram mais uns dias para ela estar na frente do auditório emocionando todo mundo com a força vulcânica das suas palavras. Ela simplesmente ignorou os slides que tinha preparado e, se tivéssemos gravado o momento, saía dali o manifesto da nossa área.
Foi “surreal”, o mesmo adjetivo que ela usou para falar sobre o encontro. Tão surreal que no final da sua fala, já entre algumas lágrimas, declaramos o desejo de uma parceria.
E não era por formalismo, era por convergência de ideias, era pela a necessidade - mutuamente reconhecida - de estruturar uma ciência psicológica do dinheiro genuinamente brasileira, que dê conta das especificidades do nosso povo e da amplitude do problema.
Estamos contando essa história hoje, porque essa parceria aconteceu.
Entre outros projetos que se desenrolam nos bastidores (que em breve você ficará sabendo), vamos oferecer, pela primeira vez, uma Aula Magna focada em aprofundar um aspecto específico da cultura financeira do nosso tempo.
Uma aula de abordagem transdisciplinar sobre a Sociologia do Consumo, que oferece embasamento crítico e consciência cultural sobre um dos temas mais importantes da atualidade.
Porque o consumo, hoje, já um pilar da nossa cultura, com impactos estrondosos seja sobre a biosfera, seja sobre nossos afetos, que transformou a maneira como nos organizamos em comunidade e como vivemos a nossa identidade. É, enfim, tema irrecusável.
O consumismo está por trás do modelo de sociedade e de mercado que temos, do problema do superendividamento, do adoecimento mental e da pulverização da saúde mental. Não, o consumismo não explica tudo, mas sem ele os problemas do nosso tempo não podem ser vistos em sua inteireza.
Na aula vamos partir do pensamento de Bauman para dialogar com outros autores e pensar a lógica de uma sociedade que transformou os consumidores em mercadorias, que cooptou o desejo e que elevou a rapidez, o excesso e o desperdício ao estatuto de valores sociais. E qual não é o impacto disso na forma como lidamos com o dinheiro e com a nossa própria vida?
Será uma aula aberta a todos, mas o convite aos psicólogos, planejadores e outros profissionais das finanças é ainda mais especial, porque vocês são capazes de propagar o impacto desse conhecimento através da sua prática profissional. Para resumir, é um convite para uma atuação culturalmente mais embasada.
É isso, o convite está feito, e feito com uma alegria que só!
Agora, é fazer a coisa certa, no lugar certo 😆
🗓️ Quando vai acontecer? sábado, 05 de outubro
⏰ Quantas horas? às 9h
📍 Onde? via Zoom
Para se inscrever e saber mais, vem por aqui →
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Entre para o Grupo de WhatsApp para psicólogos, se você, for, é claro, psicólogo (é bom ressaltar…). Você pode pedir para entrar por aqui →. Todo mês realizamos uma Roda de Conversa sobre um assunto escolhido pelo grupo, a próxima será sobre compras impulsivas.
Acesse gratuitamente o ebook Dinheiro na Terapia: Uma apresentação da Psicologia do Dinheiro para psicólogos. Apresentamos os pontos iniciais e essencial quando o objetivo é atender queixas ligadas ao dinheiro.
😆 Essa quinta (26/09) começa o Aprimoramento Profissional em Psicologia do Dinheiro na clínica, pense na animação que a gente está! Só abrimos uma turma por ano desse programa pioneiro no Brasil. Segura coração! Ainda dá tempo de entrar, mas é o último apito do trem…
A lista de espera para a próxima turma do PAF - Programa Autodescoberta Financeira está aberta! O PAF é um programa de acompanhamento para investigar a raiz dos problemas e dificuldades da sua relação com o dinheiro. Também só abrimos uma turma por ano!
Só coisa boa, gente!
Você já leu a última edição da newsletter? Falamos sobre o papel das emoções na vida financeira e porque você devia parar de brigar com elas.