Oi oi, meu povo lindo
Em mês com dia das mães, PL de igualdade salarial aprovada na Câmara e Semana Nacional de Educação Financeira o assunto dessa newsletter foi fácil de decidir.
Hoje vamos falar de dinheiro e vamos falar de mulheres. De início, vamos falar o óbvio, mas para logo em seguida falar coisas não tão óbvias sobre mulheres, sobre dinheiro e sobre mulheres com dinheiro.
Obs: tem surpresinha no final!
O óbvio
Você já deve ter alguma noção desses fatos:
Ainda existe uma significativa diferença salarial entre homens e mulheres que, segundo o IBGE, está na casa dos 22%; ou seja, mulheres recebem 1/5 a menos que os homens, fazendo o mesmo serviço. Esses dados são gerais, o que significa que exceções existem (e devem existir cada vez mais); talvez você faça parte desse grupo excepcional.
Mulheres recebem menos e trabalham mais; a tal da jornada dupla é isso. Uma jornada no trabalho convencional e remunerado, e outra em casa, nos afazeres domésticos. Dados do IBGE (2019) indicam que as mulheres gastam mais de 21h por semana no labor doméstico, comparado à média de 11h gastas pelos homens; e isso tem tudo a ver com o dia das mães, por sinal.
Por fim, historicamente, o mundo financeiro é tido como coisa de homem. Isso fica claro ao lembrar que só em 1974 as mulheres tiveram livre acesso a cartões de crédito e até 1962 mulheres casadas só podiam ter trabalho remunerado com a permissão dos maridos.
Estamos falando de autonomia, e autonomia feminina. Essa autonomia não é apenas política ou social, é também financeira. No fim das contas, uma coisa está dentro da outra, como fica claro com esses dados. Não é uma mera coincidência que a dependência financeira é a segunda principal razão que impede vítimas de romperem com o ciclo de violência doméstica (DataSenado, 2019).
A realidade vem mudando, tanto é que no começo desse mês a Câmara aprovou uma PL (nº 1.085/2023) que dispõe sobre a igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens, por exemplo.
Tudo isso é ótimo, mas aqui vamos um passo além (e adentro) da estrutura desse problema. É agora que falamos sobre coisas não tão óbvias assim.
O nem tão óbvio
Há alguns anos, atendi uma mulher que ganhava bem, mas não conseguia gastar com leveza e tranquilidade. Qualquer gasto significativo lhe gerava culpa e medo. Ela comprou um bom apartamento em um bom bairro e estava em plenas condições de pagar por ele, ainda assim, estava terrivelmente desconfortável com isso.
Olhando de perto, vi que ela tinha uma boa organização financeira, um orçamento claro, um coeficiente positivo entre o que ganhava e o que gastava e ainda por cima investia todo mês. Para muita gente, o caso está encerrado; essa mulher era financeiramente bem sucedida.
Mas olhando para sua história eu vi uma herança familiar que valorizava a simplicidade e criticava a riqueza. A voz paterna ainda ressoava: “será que você precisa de tanto?”; sem falar das crenças complicadas sobre o dinheiro, o prazer e sobre si mesma: “sou culpada por ter tanto”; “as pessoas vão se afastar de mim se eu tiver mais dinheiro do que elas”; “acho-me merecedora, mas sinto que não posso ter”; “tenho medo de me endividar”; “o sacrífico sempre esteve relacionado a perdas”.
Expus esse caso num livro que sou co-autora, o Conquistas na Psicoterapia II: novo estudos de caso em terapia EMDR. Lá eu falo melhor sobre a história dessa mulher e a abordagem que eu usei, mas eu trago esse exemplo aqui para ilustrar uma coisa que ainda passa batido:
A desigualdade financeira entre homens e mulheres não é apenas material, é também psicoemocional.
Cada gênero se nutre, ao longo de sua formação psicossocial, de recursos e ideias diferentes a respeito do dinheiro. Portanto, as bases mantenedoras da desigualdade financeira não está apenas no cenário externo das estruturas sociais, mas no cenário interno das crenças, ideais, vieses e heranças simbólicas.
Nada disso pretere, ou diminui, a importância da autonomia material. É enfaticamente mais difícil para um mulher construir sua autonomia psicoemocional sem ter algum grau de independência financeira. É bem mais fatigante - e afetivamente exigente - desenvolver ou conservar nossa saúde emocional sem alguma medida de tranquilidade financeira. Tudo isso fica ainda mais evidente na maternidade.
É por isso que políticas públicas eficientes e uma boa educação financeira são tão necessárias; em muitos casos, elas são condições prévias para que mais mulheres tenham o tempo, os recursos e a consciência necessária para se trabalharem emocionalmente.
O lado emocional da prosperidade feminina
A verdade é que depois de tanto tempo sendo alienadas do mundo do dinheiro, nós, mulheres, temos de ficar muito espertas com as estruturas implícitas de nossa mentalidade e de nossas emoções sobre as finanças.
Em anos de prática clínica, vi muitas mulheres:
sentindo um grande desconforto por ganharem mais que seus parceiros (e às vezes se sentindo sobrecarregadas financeiramente por conta disso);
usando o dinheiro para provar seu afeto e cuidar da família (mesmo sem ter o suficiente), por vezes não conseguindo negar apoio financeiro a alguma familiar, mesmo sem gostar disso;
acreditando que não são boas com o orçamento, às vezes por se acreditarem ruins em matemática, por se sentirem perdidas, confusas ou entediadas;
poupando excessivamente pelo medo de faltar ou perder sua autonomia.
abrindo mão da própria autonomia financeira, por ainda acreditarem que o papel de provedor prioritário é masculino.
Em uma cultura financeira que associa (talvez excessivamente) o dinheiro ao “poder”, e onde quem paga, é quem manda, apoiar a autonomia financeira feminina é absolutamente essencial para a justiça social. Mas é preciso dizer que essa tal autonomia financeira não é apenas um fato material, não é só ter dinheiro entrando na conta, mas é também um fato psicológico.
Existe uma liberdade que sua conta bancária te dá, e ela é extremamente importante, mas existe uma liberdade que sua cabeça te dá, e ela talvez seja mais importante ainda.
Eu digo isso porque essa liberdade interna dá bases firmes para que você construa uma vida financeira realmente autônoma. Com isso eu quero dizer uma vida financeira em que suas decisões sejam tomadas sem culpa, sem medo de ferir os outros, sem receio de ser abandonada, julgada ou diminuída; uma vida financeira cujos rumos você pode decidir a partir de suas reais necessidades e preferências, sem colocar sempre o outro à frente de você.
Inteligência financeira e emocional
Com o risco de soar repetitivo, o que muitas mulheres precisam é não apenas de inteligência financeira, como saber se planejar, definir metas, investir, poupar etc., mas de inteligência emocional financeira, que é ter autonomia diante do se sente e ser capaz de tomar decisões financeiras verdadeiramente livres, que tragam prosperidade de verdade.
Estou falando de entender o que você sente sobre o dinheiro, o que está intimamente relacionado ao que você acredita sobre o dinheiro, e que vai impactar decisivamente como você age com o dinheiro.
É claro que essa inteligência é extremamente valiosa tanto aos homens, como às mulheres, mas como o contexto social tende a ser mais desfavorável ao mundo feminino, eu diria que essa é uma habilidade ainda mais relevante para nós, o “segundo sexo”.
…
Se você, homem ou mulher, quer desenvolver essa habilidade, te convido para a oficina gratuita e online de Inteligência Emocional Financeira que vou dar nesse sábado (20/05), às 15h, na Semana Nacional de Educação Financeira.
Você pode se inscrever ou saber mais <<clicando aqui.>>
Como pode ter percebido, juntei o útil e o agradável e aproveitei para falar sobre esse assunto por aqui (hihi).
Surpresinha
Pra fechar, hoje temos uma pequena curadoria de conteúdo, espero que goste:
Um episódio de podcast sobre finanças e autonomia feminina com Eduardo Amuri e Maíra Liguori
Já conhece o Lab Think Olga? Um espaço de conhecimento, investigação e produção de conteúdos com foco em inovação social para as mulheres. Você pode começar vendo sobre autonomia emocional.
3 pesquisadoras que você deveria seguir no instagram: uma sobre trabalho e autonomia feminina; outra sobre saúde mental e gênero; e outra sobre psicologia do dinheiro.
Um abraço,
Adriana e equipe Psicologia e Dinheiro
Somente hoje consegui vir aqui ler essa newsletter. Nossa! Quantas verdades óbvias e não tão óbvias porque nos fazem acreditar que nossas percepções e verdades internas são bobagens ou frescuras femininas. Meu trabalho é voltado para mulheres e tenho percebido nos relatos das minhas clientes o tanto de barreiras emocionais que ainda nos impedem de termos uma relação mais saudável com o nosso dinheiro. Só para citar um exemplo - a mulheres tem muito mais dificuldade em iniciar uma vida de investidora do que os homens. Principalmente porque não têm espaço fisíco, emocional e mental para pensar em guardar/investir dinheiro, mas também porque não se sentem autorizadas a ocuparem esses espaços com naturalidade. Muitas questões envolvidas - obrigada por essa newsletter!